A ascensão do “Rei do Arroz” e o eterno debate culinário: o que a ciência e o mercado dizem sobre o grão
O mercado global de grãos atravessa um momento de transformação significativa, impulsionado pela valorização de variedades premium. O arroz Basmati, frequentemente aclamado como o “Rei do Arroz” devido ao seu aroma distinto e grãos alongados, deixou de ser apenas um ingrediente regional do subcontinente indiano para se tornar uma commodity cobiçada em cozinhas ao redor do mundo. Análises recentes estimam que esse setor, avaliado em robustos US$ 14,7 bilhões em 2024, está pronto para um salto impressionante. Projeções indicam que a indústria alcançará quase US$ 38 bilhões até 2035, com uma taxa de crescimento anual composta de 9%.
O impulso global e a busca por qualidade
Esse crescimento vertiginoso não é acidental. Ele reflete uma mudança nos hábitos alimentares globais, onde uma classe média em expansão, com maior renda disponível, opta por trocar o arroz comum por variedades aromáticas e de maior qualidade, tanto para refeições cotidianas quanto para ocasiões especiais. A popularização da culinária étnica — indiana, paquistanesa e do Oriente Médio — serve como catalisador, introduzindo o Basmati a novas bases de consumidores.
Simultaneamente, a indústria responde com inovação. Observa-se uma forte tendência voltada para a saúde e o bem-estar, com consumidores buscando o Basmati integral e orgânico devido ao seu índice glicêmico mais baixo em comparação a outras variedades. A conveniência também dita as regras: pratos prontos para cozinhar e versões fortificadas com vitaminas ganham espaço nas prateleiras, apoiados por cadeias de suprimentos que agora priorizam a rastreabilidade e a autenticidade dos grãos.
Mitos e verdades na hora do preparo
Enquanto o mercado se sofistica e o arroz chega às despensas brasileiras — seja o tradicional ou o premium Basmati —, persiste uma dúvida ancestral na hora de preparar o onipresente companheiro do feijão: é realmente necessário lavar o arroz? O consenso popular dita que a lavagem é essencial para garantir aquele arroz “soltinho”, removendo o amido superficial supostamente criado durante a moagem. A ciência, contudo, aponta para uma direção diferente.
Pesquisas recentes compararam diferentes tipos de grãos, incluindo o glutinoso e o jasmim, submetendo-os a variados níveis de lavagem. O resultado surpreendeu: o processo não alterou a viscosidade ou a dureza final. O estudo demonstrou que o amido responsável por essas características não é a amilose superficial, mas sim a amilopectina, que se desprende de dentro do grão durante o cozimento, e não sob a água fria da torneira.
Segurança alimentar e o perigo invisível
Se a busca pelo arroz soltinho não justifica a lavagem, questões de higiene ainda pesam na decisão. Historicamente, lavar o arroz servia para eliminar poeira, insetos e restos de casca, algo que ainda é válido se o processamento do produto não for meticuloso. No que tange às bactérias, a lavagem é redundante, pois as altas temperaturas do cozimento são suficientes para eliminar micróbios. O verdadeiro risco sanitário reside no armazenamento: o arroz cozido deixado em temperatura ambiente permite a proliferação de esporos de Bacillus cereus, que liberam toxinas resistentes ao calor e causam graves problemas gastrointestinais.
Entretanto, há motivos contemporâneos e alarmantes que tornam a lavagem recomendável. O uso intensivo de plásticos na cadeia alimentar resultou na presença de microplásticos nos grãos, e a lavagem pode remover até 20% desses intrusos. Mais crítico ainda é o arsênico, um elemento que pode estar presente em níveis elevados dependendo do local de cultivo. A água corrente é capaz de remover até 90% desse contaminante.
O veredito nutricional
Existe, porém, um custo nutricional para essa limpeza extra. Ao lavar o arroz para se livrar do arsênico e de microplásticos, nutrientes essenciais como cobre, ferro, zinco e vanádio também são levados pelo ralo. Diante desse cenário, a melhor estratégia para equilibrar saúde e segurança parece ser manter a lavagem para evitar contaminações químicas e compensar a perda de nutrientes consumindo outros alimentos ricos nesses minerais. Ironicamente, a solução está no próprio prato brasileiro: o feijão, parceiro inseparável do arroz, é perfeito para repor exatamente o que a água levou.